A aplicação da Lei de Processo Administrativo ao TCU


Destaques e Notícias | 4 de junho / 2020

A Lei de Processo Administrativo (Lei Federal nº 9.784/99 – LPA) deve ser aplicada aos procedimentos do Tribunal de Contas da União? A jurisprudência da própria Corte não confere uma resposta clara à pergunta.

Recentemente, norma processual prevista no diploma foi utilizada como fundamento decisório do Acórdão nº 4719/2020-2ªC, que apreciou recurso em Tomada de Contas Especial. Na oportunidade, o Ministro Vital do Rêgo concluiu que a decisão recorrida havia aplicado retroativamente nova interpretação à legislação vigente à época dos fatos, o que seria vedado justamente pelo art. 2º, parágrafo único, XIII, da LPA.

Em outras oportunidades, no entanto, o TCU decidiu pela inaplicabilidade da Lei de Processo Administrativo à atividade de controle externo do TCU, sob o argumento de que esta norma incidiria apenas em seus processos internos.[1]

A incerteza sobre a aplicação da norma processual, sem que se estabeleçam critérios pacíficos, gera insegurança jurídica.

O recente reconhecimento da aplicação da LPA pelo Tribunal em sua atividade-fim traz à discussão o devido processo legal administrativo no Tribunal. É notório que a LPA traz garantias que, apesar de compatíveis com o procedimento do TCU, não encontram dispositivo correspondente em sua Lei Orgânica (Lei nº 8.443/94).

Um exemplo é o direito de apresentação de alegações finais em processos que possam resultar em sanções (art. 2º, parágrafo único, inciso IX, da LPA), que é afastado pela jurisprudência do Tribunal[2]. Sua observância não apenas reforçaria o direito ao contraditório, mas poderia evitar eventual extensão processual indevida e retrabalhos com a análise de elementos novos extemporâneos, com um custo temporal muito baixo ao andamento dos procedimentos.

Outras garantias da LPA não aplicadas pela Corte de Contas dizem respeito à legitimação, como interessados, daqueles que exercem o direito de representação (art. 9º, inciso I) e ao requerimento de perícias por interessado (art. 38), ambas ferramentas que poderiam ampliar a participação de particulares no processo administrativo e robustecer o conjunto informacional a amparar a tomada de decisão do Tribunal.[3]

A incerteza quanto à incidência da LPA nos processos do TCU, aliás, não foi resolvida pelo Regimento Interno, que aponta que se aplicam “subsidiariamente no Tribunal as disposições das normas processuais em vigor, no que couber e desde que compatíveis com a Lei Orgânica” (art. 298). Talvez a solução venha apenas quando da aprovação do já antigo projeto de novo Regimento Interno, que pretende estabelecer expressamente a aplicação supletiva e subsidiária da LPA.[4]

Está ao alcance do TCU incorporar de forma inconteste o devido processo legal administrativo previsto na LPA. Por ora, contudo, sua jurisprudência gera mais questionamentos do que respostas.

Artigo publicado no Jota.