BDI referencial na prática: quando o TCU adota um percentual mais elevado?


Destaques e Notícias | 21 de fevereiro / 2024

Um dos aspectos que mais se destaca na orçamentação de obras e serviços de engenharia é a taxa de BDI, isso é, de benefícios e despesas indiretas. Trata-se de percentual incidente sobre os custos diretos do empreendimento, abarcando tanto os gastos indiretos quanto o lucro a ser auferido pelo particular contratado.

Por sua relevância para as contratações públicas, o BDI é um ponto de atenção dos tribunais de contas quando da avaliação da economicidade de obras de engenharia. O Tribunal de Contas da União (TCU), em especial, preocupou-se em definir quais seriam faixas aceitáveis de taxas de BDI a serem adotadas pela Administração Pública.

Nesse sentido, já há dez anos o TCU emitiu o Acórdão 2622/2013-Plenário, por meio do qual estabeleceu parâmetros de análise do BDI para diferentes tipos de obra pública. Para cada um desses tipos, então, foram indicados três quartis a fim de balizar as análises em cada caso.

Apesar do esforço de objetivação da temática, na prática perante a Corte de Contas nem sempre é claro o critério utilizado para selecionar um BDI referencial inferior (1º quartil), médio (2º quartil) ou superior (3º quartil). É interessante, então, verificar algumas situações concretas em que o TCU validou a utilização de taxas de BDI mais elevadas, coerentes com o 3º quartil referencial, em detrimento de valores médios ou mais baixos.

Um primeiro caso de destaque é o TC 017.647/2014-2, Representação referente a obras de construção de uma biblioteca e a reforma de um edifício pela Administração Regional do Serviço Social do Comércio no Espírito Santo (Sesc-AR/ES). Por meio do Acórdão 3266/2022-1ª Câmara, o TCU traz que a reforma em questão justificaria a adoção do 3º quartil de BDI referencial, visto que a restauração de uma edificação histórica traria “um valor de risco maior do que seria observado em uma construção nova”.

Já no TC 010.163/2015-8, Auditoria acerca da construção do Complexo de Pesquisa e Desenvolvimento em Saúde e Produção de Imunobiológicos localizado no Município de Euzébio/CE, foram consideradas dificuldades específicas do caso para validação de taxa mais elevada de administração local. O Acórdão 2571/2018-Plenário destaca, em particular, a “falta de infraestrutura da localidade” e a necessidade de “contratação de equipe para implantação e acompanhamento do processo de certificação ambiental”.

No TC 028.499/2012-3, então, a adoção do 3º quartil referencial para o BDI se baseou na especificidade e na complexidade do objeto, bem como na “modalidade não usual da contratação” (Acórdão 136/2022-Plenário). Tratou-se de Tomada de Contas Especial referente aos sistemas de sinalização, controle de tráfego e energia e sistemas de telecomunicações do Metrô de Salvador, contratação realizada na modalidade de empreitada integral por preço global (turn-key).

Destaca-se, por fim, o TC 023.220/2009-9, Representação relativa à construção do aeroporto de São Raimundo Nonato, no Estado do Piauí. Por meio do Acórdão 477/2015-Plenário, o TCU trouxe que “a faixa de variação do BDI se presta a considerar as variações existentes no trinômio empresa/obra/mercado”, evitando assim “um valor de referência estanque, que poderia estar dissociado da realidade”.

A análise desses casos concretos, embora longe de esgotar o assunto, revela que o TCU já validou a utilização do 3º quartil referencial para a taxa de BDI quanto a obras de tipologias diversas, em diferentes estados da federação e em épocas também variadas.

O traço comum a essas hipóteses parecem ser as dificuldades específicas demonstradas no caso concreto, sejam decorrentes de aspectos práticos como a infraestrutura local, sejam relacionadas ao risco dos serviços, como no caso de reforma de patrimônio histórico, sejam por conta da complexidade do objeto ou mesmo da modalidade de contratação.

Artigo publicado no JOTA em 18/02/2024.