Limites à efetividade de cautelares restritivas de bens no TCU


Destaques e Notícias | 16 de outubro / 2020

O TCU faz uso de medidas cautelares de constrição patrimonial para resguardar o ressarcimento de danos em apuração. Os limites para imposição e execução de medidas dessa natureza são frequentemente debatidos, inclusive perante o Supremo Tribunal Federal,1 sendo que recentemente foram colocadas em questão as condições para arresto de bens de responsáveis.

O arresto de bens oriundo de processo de controle externo está previsto no art. 61 da Lei 8.443/1992 e, diferentemente das demais medidas cautelares, não é operacionalizado pelo próprio TCU, mas pelo Judiciário mediante provocação da Advocacia-Geral da União pela Corte de Contas. Recentemente, contudo, a AGU levantou possível incompatibilidade do instituto com o CPC/15, o que foi levado ao Plenário da Corte em comunicação do Ministro Benjamin Zymler.2

A questão foi suscitada no TC 021.534/2017-9, processo autuado para viabilizar a indisponibilidade de bens de gestor público condenado em débito por superfaturamento nas obras da Ferrovia Norte-Sul (FNS). Segundo a AGU, o caso não comportaria a cautelar de arresto de bens, pois, não tendo havido o trânsito em julgado no âmbito da Corte de Contas, não seria ajuizada ação judicial principal no intervalo de 30 dias, em desacordo com a Súmula 482 do STJ.3

Ocorre que, no entendimento do TCU, aguardar o trânsito em julgado “tornaria inútil e sem sentido [o arresto de bens], visto que se trata de medida de natureza cautelar”.4 Para o Tribunal, o arresto de bens previsto em lei só seria eficaz se pudesse ser manejado antes do encerramento do trâmite na jurisdição de contas.

Essa não é a primeira oportunidade em que a eficácia de cautelares de constrição patrimonial foi debatida pelo TCU. Em 2019, também em processo referente à FNS (Acórdão 1657/2019-TCU-P), o TCU deixou de prorrogar indisponibilidade de bens em razão de sua baixa efetividade no caso de pessoas físicas, assim como de outras dificuldades na sua aplicação.5 A decisão foi abordada em coluna anterior do Observatório do TCU, que aventou o início de um movimento de autocontenção do Tribunal.

Naquela oportunidade, determinou-se a constituição de grupo de trabalho a fim de eliminar as dificuldades de identificação de bens de responsáveis e avaliar a efetividade dessa medida. Agora, com o novo posicionamento da AGU, decidiu-se incluir no escopo desse grupo de trabalho a apresentação de possíveis alternativas para dar concretude à medida de arresto de bens, amoldando-a ao CPC/15.6

Diante das dificuldades enfrentadas na utilização de medidas cautelares, o TCU está numa encruzilhada: como garantir o ressarcimento ao erário dentro dos limites legais? Como trazer eficácia e efetividade ao controle sem cometer excessos?

Pelo caráter gravoso dessas medidas, trata-se de discussão delicada, que deve ser sopesada com a efetiva necessidade de constrições patrimoniais em cada caso concreto. Nesse cenário, é positiva a iniciativa da Corte de Contas de se aprofundar no tema e buscar soluções viáveis, condizentes com as normas jurídicas em vigor.

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1 Está em aberto o entendimento do STF quanto à possibilidade de se prorrogar cautelar de indisponibilidade de bens além do prazo de um ano (art. 44, §2º, da Lei nº 8.443/1992), como se observa no MS 34233 e no MS 34545, entre outros. Além disso, foi questionada ao Supremo a competência cautelar do TCU para impor a indisponibilidade de bens a particulares, mas os processos em questão – MS 34357, MS 34410, MS 34421, MS 34392 e MS 35506 – foram extintos por perda de objeto.

2 Comunicação do Ministro Benjamin Zymler na Sessão Plenária de 12/08/2020.

3 Súmula 482/STJ: “A falta de ajuizamento da ação principal no prazo do art. 806 do CPC acarreta a perda da eficácia da liminar deferida e a extinção do processo cautelar”.

4 Despacho do Ministro Benjamin Zymler no TC 021.534/2017-9, em 11/08/2020.

5 A mesma preocupação havia sido levantada em decisões anteriores, tais como o Acórdão 735/2019-TCU-P e o Acórdão 1375/2019-TCU-P.

6 Ordem de Serviço-TCU nº 9, de 2 de setembro de 2020. Disponível no BTCU Ano 53, nº 169, de 04/09/2020.

Artigo publicado no Jota.