Recentemente, como noticiado pelo JOTA, o relator da Reforma Tributária (PEC 45/2019) recebeu documento do TCU com apontamentos sobre a principal agenda congressual no campo econômico. A entrega foi comunicada pelo presidente do TCU durante a última sessão plenária do mês de setembro.
No caso, o TCU funcionou como assessor legislativo do Congresso no exame da proposta de reforma constitucional. Em uma primeira leitura da Constituição, esse papel auxiliar da Corte de Contas ao Poder Legislativo soa como decorrência lógica da redação do caput do artigo 71. Para aqueles que acompanham de perto a prática do controle externo, no entanto, ele parece pouco usual. Qual norma o preveria? Teria a Corte de Contas capacidade institucional para agir desse modo?
O detalhado relatório sugere que o exame do TCU não decorreu de Solicitação do Congresso Nacional, mas de ato de ofício do próprio TCU, mediante Ordem de Serviço emitida por sua Secretaria Geral de Controle Externo. O papel de “apoio técnico” teria “como objetivo identificar riscos de natureza econômica e jurídica na Proposta de Emenda Constitucional”.
Em pouco mais de dois meses, o Grupo de Trabalho (GT) composto por técnicos do TCU elaborou relatório centrado em três eixos temáticos: “1) impactos econômicos e fiscais da reforma, na economia como um todo, em seus diversos setores e nos entes federados; 2) estimativa da alíquota-padrão e custo das exceções; e, 3) governança da tributação sobre o consumo, envolvendo o Conselho Federativo do IBS, inclusive seu controle externo, bem como o contencioso tributário”. Em linhas gerais, há validação técnica para a reforma, destacando benefícios econômicos e sociais gerados pela criação de imposto de valor agregado e ratificando tecnicamente contas apresentadas pelos entes governamentais.
O GT reconheceu a compatibilidade do Conselho Federativo do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) com o pacto federativo. No entanto, apontou alto risco de desalinhamento entre o IBS e a Contribuição Social para Bens e Serviços (CBS), bem como alto impacto sobre contencioso tributário, com risco de decisões divergentes entre Justiça Federal e Justiça Estadual. Além disso, foram destacados problemas de governança relacionados à ausência de mecanismos de controle externo sobre o Conselho. Desta última fragilidade decorreu a proposta de “criação de órgão colegiado dos tribunais de contas para realizar o controle externo”, com papel decisivo do próprio TCU.
A produção do relatório sobre a PEC 45/2019, a cargo da equipe de auditoria do TCU, foi comunicada pela presidência da Corte em sessão plenária (i.e., não se adotou o rito de relatoria de ministro e aprovação por colegiado). Essa inovação aponta para uma dinâmica interativa peculiar entre TCU e Congresso, com a possibilidade de influência direta da Corte em discussões legislativas a partir de manifestações cujo timing e escopo podem ser definidos pelo próprio órgão de controle.
Cumpre examinar se esse tipo precoce de assessoria do TCU ao Parlamento irá se consolidar como prática institucional e quais são seus impactos sobre o resultado de deliberações legislativas e sobre o próprio papel político da Corte de Contas.
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