Em maio de 2023, o plenário do TCU examinou o funcionamento e o processo de tomada de decisão da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Mineração (ANM).
O controle do TCU sobre agências é uma das temáticas mais candentes na literatura e na prática do controle externo brasileiro. Controlar o regulador envolve dinâmicas complexas, com ampla gama de questões jurídicas sobre os limites das competências constitucionais do TCU e questões pragmáticas relacionadas aos riscos e consequências de sobreposições decisórias em setores regulados.
Aqui, a pergunta é ainda mais específica. Tem o TCU algum papel no processo de criação e institucionalização de uma nova agência reguladora? Caso sim, como o Tribunal de Contas deve participar do processo de estruturação dessa agência para funcionar como mecanismo catalizador do amadurecimento regulatório? Como um processo de acompanhamento pode apresentar resultados positivos sem interferir indevidamente na substância de suas atividades decisórias?
Este é o cerne do recente Acórdão 1.108/2023-P, que consolidou os resultados da segunda fase de acompanhamento da criação da ANM. Temos aqui um bom exemplo de como 1) restringir o escopo do controle a questões de ordem procedimental; e 2) demonstrar cautela no exercício dos poderes de comando em respeito ao espaço de atuação do regulador bem-intencionado.
O TCU já havia iniciado o acompanhamento da ANM antes mesmo de sua instalação. O primeiro acórdão sobre a matéria foi bastante crítico e apontou uma série de falhas (Acórdão 2914/2020-P). Houve recomendações e determinação, inclusive quanto à transparência de aplicação de recursos arrecadados e inadequação dos recursos humanos.
Nesta oportunidade, contudo, o acompanhamento direcionou-se tão somente à análise do processo de tomada de decisão da Diretoria Colegiada. Partiu-se da crença de que a autonomia decisória da nova agência constituiria seu principal traço distintivo em relação ao antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).
O tribunal reconheceu o esforço de aperfeiçoamento regulatório da ANM, apresentando como evidência o amplo leque de normas editadas pela agência. Além disso, aferiu a produção da Diretoria a partir de critérios procedimentais objetivos, sem investir sobre uma análise substancial do mérito de decisões. Notou, por exemplo, a existência de procedimentos de acesso público que asseguram transparência e publicidade da atividade decisória, inclusive com decisões colegiadas lastreadas em considerações de fato e de direito e em pareceres técnicos.
Mesmo no caso em que o tribunal verificou fragilidade, relacionada ao funcionamento precário do Comitê Interno de Governança, optou-se por não emitir ato de comando. Isso porque foi reconhecido o esforço de melhoria já realizado pela ANM, em um voto de confiança importante sobre o natural processo de amadurecimento regulatório.
O acompanhamento da institucionalização de uma nova agência pode ser produtivo se assumir um caráter colaborativo. Neste recente julgado, o tribunal demonstrou estar menos focado em emitir atos de comando e mais propenso a funcionar como repositório de boas práticas para auxiliar o natural processo de amadurecimento regulatório.
© 2018 PIQUET MAGALDI GUEDES. Todos os direitos reservados